Caçada na África, o turismo da crueldade, por Fabio Steinberg

Triste sinal dos tempos: com a rarefação da sua espécie, Cecil e companheiros de espécie passaram a ser conhecidos por seus nomes próprios. É que não há no mundo mais que 20 mil leões sobreviventes, cinco vezes menos que 30 anos atrás. Pior ainda: nos anos 40 haviam 500 mil, e no século 19 mais de um milhão. Mantido o ritmo, dentro de dez anos a raça será extinta. As razões? Perda progressiva do habitat natural, somado ao conflito de leões com os homens.

O problema não se resume a este lamentável caso dentário. A África ainda convive com as caçadas, um tratamento bárbaro que atinge não só leões, mas também rinocerontes, elefantes, crocodilos, babuínos, leopardos e búfalos, entre outros animais desta fauna fantástica do continente. Há até empresas especializadas em todo o mundo para incentivar esta atividade. Como a inglesa Settlers Safaris, que oferece por 14 mil libras (algo como 80 mil reais) safaris assassinos com a garantia de matar pelo menos um leão ou leoa ao final da jornada de sete dias. Pelo dobro do valor, a também inglesa Shavesgreen Safaris promete uma truculenta matança generalizada de várias espécies africanas. Mantido o ritmo da destruição, estes animais futuramente só poderão ser vistos sob a forma de desenhos animados ou bichinhos de pelúcia.

H at empresas especializadas em todo o mundo para incentivar esta atividade. (Foto: divulgao)

Há até empresas especializadas em todo o mundo para incentivar esta atividade. (Foto: divulgação)

Com os elefantes, a situação não é nada melhor. Como se não bastassem os tais safaris destruidores, há ainda a matança ilegal em massa, feita com metralhadoras e granadas, dando sumiço de 30 a 50 mil elefantes por ano, em busca do marfim. Além disso, a ocupação progressiva de territórios reduziu a população destes animais na África Central em 64%, só na última década. Estima-se que em todo o continente sobraram ainda uns 500 mil dos 3 a 5 milhões que existiam há cem anos.

Para amenizar, há uma boa notícia. Trata-se da progressiva expansão de um turismo saudável da vida selvagem, que é ecológico e sustentável. Esta indústria deve se tornar multimilionária, o que vai incentivar cada vez mais a observação e o contato amigável com os animais em seu habitat natural. Claro que há sempre impactos negativos, como a invasão de turistas em grande número, a construção de muitos hotéis em territórios antes intocados, e a própria perturbação da rotina dos animais.

Mas nada é tão grave que um bom planejamento e controle cuidadoso não resolvam. Os benefícios superam de longe as desvantagens. Cria-se assim um círculo virtuoso no qual a própria sobrevivência das hospedagens ecológicas e atrações da vida selvagem dependem diretamente da preservação e restauração do habitat nativo. Esta situação favorável, por sua vez, é alimentada pelo maior fluxo de turistas, mais donativos a instituições de apoio a espécies em risco de extinção, assim como recursos adicionais para a conservação e melhoria das condições dos animais e das tribos locais, assim como a geração de empregos.

Há ainda um bônus adicional: a presença contínua de visitantes nos safaris ecológicos desestimula a matança indiscriminada e ilegal dos animais, assim como inibe malucos como o dentista Walter Palmer a buscar novas aventuras assassinas.

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