Casa Ermelinda Freitas: as mulheres do vinho – GQ Portugal

A Casa Ermelinda Freitas foi sempre gerida, ao longo de quatro gerações, por mulheres que iam ficando viúvas. A atual proprietária, Leonor Freitas, tem honra nesta história muito feminina e prepara já a filha para continuar o negócio.

A história da Casa Ermelinda Freitas, em Fernando Pó, Palmela, só pode ser contada no feminino e a justificação é bem simples. Em quatro gerações da família, foram sempre as mulheres que estiveram à frente do negócio. Coisa rara, sem dúvida, ainda para mais tratando-se de uma área que até há bem pouco tempo era praticamente reservada aos homens. Afinal, a razão estava ligada à história de viuvez das matriarcas.

Tudo começou em 1920, altura em que Deonilde Freitas ficou viúva e teve de assumir, sozinha, os destinos de uma casa agrícola. Sucedeu-lhe a sua filha Germana Freitas, mas de novo quis o destino que perdesse o seu marido aos 34 anos. Germana não sabia ler nem escrever (o lugar das mulheres era em casa e nem a escola lhes era facultada), no entanto, e lutando contra todas as limitações, continuou a liderar o negócio. Anos mais tarde, coube à sua filha, Ermelinda Freitas, tomar a empresa em mãos, desta feita ajudada pelo seu marido. Só que este viria a falecer aos 59 anos e lá ficou Ermelinda no comando, tal como a sua mãe e a sua avó o tinham feito antes.

Quanto à sua única descendente, tudo apontava para não vir a ficar à frente da empresa. Com efeito, libertou-se muito cedo da vida do campo e alargou fronteiras, entregando-se aos estudos. Mas, mais uma vez, o destino reservou-lhe um outro lugar na vida. Depois da morte do seu pai, a mãe Ermelinda acaba por confessar-lhe que não consegue aguentar todo o negócio. A solução era vender ou então Leonor teria de largar tudo e voltar a Fernando Pó para ajudar. O chamamento da terra e das origens da família foi mais forte e Leonor Freitas regressou a casa. Com os 60 hectares que possuíam, faziam e vendiam o vinho a granel, mas a casa que o comprava, deixou de o fazer. Depois do susto inicial, Leonor meteu-se numa aventura para salvar a subsistência da família. Começou a vender o vinho em ‘bag-in-box’, mas, ao contrário de outros, este tinha muita qualidade.

O entusiasmo cresce, recorre aos bancos para construir a adega e compra maquinaria. Hoje, a Casa Ermelinda Freitas tem já 440 hectares de terra e produz 12 milhões de litros, tudo a ir para mercados alvo como Angola, Moçambique, Brasil, Escandinávia, Luxemburgo, Inglaterra, França, Japão e China.

Mas o negócio não se fica pelo vinho. O enólogo Jaime Quendera também produz espumante, moscatel e aguardente e com tanta história de sucesso, Leonor Freitas já espera que a quinta geração a substitua com êxito. A filha Joana vai continuar o seu trabalho, ajudada pelo filho, este mais voltado para a informática. Assim, tudo se conjuga para que seja outra mulher a lide- rar a Casa Ermelinda Freitas.

Uma casa premiada, com certeza

Este já se antevê como o melhor anos de sempre da Casa Ermelinda Freitas, avança a companhia. Só nos primeiros 5 meses de 2017, o nome já ganhou 154 prémios, um acréscimo aos mais de 900 prémios ganhos a nível nacional e internacional – desde 1999, a Casa Ermelinda Freitas já soma 345 medalhas de ouro, 384 medalhas de prata e 203 de bronze.

Leonor Freitas (sócia-gerente da Casa Ermelinda Freitas), diz que “para mim e para a minha equipa qualquer vinho que é distinguido é sempre um grande motivo de orgulho, pois significa que estamos no caminho certo. Por exemplo este ano já ganhámos desde o início do ano um total de 154 prémios, o que significa que os nossos vinhos possuem qualidade destacada, o que os faz realçar nos melhores e maiores concursos nacionais e internacionais, ProdExpo, CVRPS XVI Concurso 2017, Challenge International du Vin 2017, Vinhos de Portugal 2017, Portugal Wine Trophy 2017, entre outros.”

O atual rosto por detrás do vinho explica também que, a par do entusiasmo pelos galardões, é também preciso não esquecer e descurar uma responsabilidade social: o projeto “A Vida de Um Vinho”consistiu na criação de 1.500 garrafas Magnum (1,5L) do melhor vinho que é produzido na adega. O espécime é vendido num pack com um rótulo especial feito por um pintor do Porto, Mário Rocha, com uma sinfonia gravada pelo maestro Jorge Salgueiro e com um livro sobre este vinho escrito por Amilcar Malhó. O conjunto esta a ser vendido na adega e toda a receita conseguida reverte a favor dos idosos da freguesia local, União de Poceirão e Marateca, sendo que a verba é gerida e aplicada pela Caritas Diocesana de Setúbal.

Ermelinda Freitas tem também enoturismo e um núcleo museológico

Com 440 hectares de vinha, pode descobrir os detalhes dos processos de vinificação antigos e atuais nos terrenos onde estão plantadas as 29 castas presentes na produção dos vinhos da marca. Na nova adega, inaugurada no final do ano passado, observam-se todas as fases de produção, do esmagamento até ao engarrafamento, e durante a visita pode também ver-se o trabalho laboratorial da equipa de enólogos da empresa e explorar a Sala de Ouro, onde estão expostas as mais altas disitinções atribuídas aos vinhos Ermelinda Freitas, bem como uma pequena exposição sobre a produção das rolhas de cortiça.

Depois da visita, abrem-se as portas da antiga adega da família, agora denominada Casa de Memórias e Afetos, e conhece-se a história da família e a construção desta empresa, que se iniciou na venda de vinho a granel (sem marca) com vinhas desde 1920, e que se lançou com a primeira marca em 1997. Neste espaço museológico cujo núcleo principal é dedicado às quatro gerações familiares que deram origem à empresa, encontra cinco espaços de exposição, que exploram a origem do topónimo Fernando Pó, o percurso familiar e empresarial dos proprietários, alguns objetos pessoais das (os) protagonistas e equipamentos e ferramentas relacionados com os trabalhos agrícolas em geral e vitivinícolas em particular e é ainda apresentada a atividade manual do trabalho no lagar. Naquela que foi a primeira adega da empresa, agora remodelada, observam-se os depósitos originais, alguns equipamentos e os primeiros vinhos engarrafados, no final do séc. XX início do séc. XXI e respetivos prémios. O espaço original onde se efetuou a destilação de aguardentes, com a respetiva caldeira e uma sala com várias balanças, pesos e medidas, completam a área expositiva.

“A Casa Ermelinda Freitas sempre apostou no respeito pela tradição, mas modernizando, foi assim nas vinhas, na adega e será também na vertente do enoturismo.”, explica Leonor de Freitas. “Pensamos que é essencial ligar o sector dos vinhos ao enoturismo, a vinha e o vinho são produtos de excelência turísticos para passarmos valores ligados ao que é o património cultural, transmitido através das diversas castas que temos plantadas (29 variedades), e também para transmitir a pedagogia de que o vinho é uma bebida saudável desde que integrado na alimentação e bebido com moderação. Com esta vertente cultural e pedagógica queremos muito trazer visitas, passar a nossa mensagem e historia de família, onde podem constar e observar o nosso jardim de vinhas e fazerem as provas dos nossos vinhos assim como também podem almoçar ou jantar com um grupo de amigos num ambiente confortável, tão próximo de Lisboa, mas tão diferente.”

No final desta visita enoturística, provam-se cinco vinhos que acompanham com produtos regionais, como o queijo, o pão, o chouriço, ou as compotas, uma proposta em cheio pela módica quantia de €7,50 (preços variam consoante o número de pessoas). Convém marcar previamente, principalmente se quiser almoçar ou jantar.

A propriedade possui também uma sala multiusos com capacidade para 350 pessoas, preparada para acolher eventos e com um terraço com vista panorâmica para o jardim das vinhas.

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