Os guias de turismo se sentaram em um trailer branco e poeirento a poucos passos do porto principal, tomando um caf preto e forte e fumando. Havia 42 deles, prontos a mostrar a um visitante um stio arqueolgico mundialmente famoso, em at nove idiomas. Mas, ainda que este fosse um dia ensolarado de primavera, no havia trabalho para 38 deles.
“Quatro anos atrs, eu faria de dois a quatro tours por dia”, disse Ahmed al-Qaim, 43, que trabalha como guia turstico h 19 anos. “Agora, ns mais ficamos sentados discutindo coisas do tipo ‘Como voc gosta do caf?'”
As runas da cidade antiga de Gerasa, hoje conhecida como Jerash, esto entre as mais bem preservadas de qualquer cidade provincial do Imprio Romano. Monumentos e templos, banhos e anfiteatros, praas e colunatas transportam os visitantes para alguns sculos antes de Cristo, quando a cidade prosperou sob imperadores como Trajano, Adriano e Antonino. As marcas de bigas ainda podem ser vistas nos antigos pavimentos.
O stio de cerca de 650 mil metros quadrados j foi uma das principais atraes tursticas da Jordnia, e uma fonte sustentvel de receitas a longo prazo. Mas fica a apenas cerca de 30 quilmetros da fronteira com a Sria, onde uma guerra civil tem se estendido h quatro anos –e os conflitos na regio so tudo, menos um m para visitantes estrangeiros.
Locais em toda a Jordnia esto sofrendo. Em 2010, um ano antes de a Primavera rabe irromper na regio, 8,2 milhes de pessoas visitavam o pas, segundo o Banco Mundial, mas em 2013 o nmero caiu a 5,4 milhes, e continua em queda. Muitos dos estrangeiros que vm agora no so turistas, mas pessoas trazidas pela exata perturbao que os mantm longe: voluntrios, diplomatas, jornalistas, refugiados.
O ministro de Turismo e Antiguidades disse que as visitas a Jerash caram cerca de 35% neste ano, em relao a 2014. Em outros destinos, como o monte Nebo, Wadi Rum e Karak, a queda foi ainda mais aguda, em cerca de 50%.
“Quando olho pela regio, no vejo motivos para ser otimista”, disse Ahmad Shami, autoridade do ministrio responsvel por Jerash. “Temos a responsabilidade de promover e preservar Jerash, porque este local pertence ao mundo e humanidade.”
Alguns jordanianos dizem que aquilo que o ministro chama de problema , na verdade, uma oportunidade. “Ningum est indo ao Imen, Sria ou ao Iraque”, disse Thiab Atoom, que recentemente abriu um restaurante na estrada que leva ao porto de Jerash. “Isso no algo que deve ser usado contra ns –deveria ser uma oportunidade de dizer ‘a Jordnia um refgio, venha para c!’, mas no estamos fazendo o suficiente para atrair visitantes.”
Em tempos mais calmos, alguns anos atrs, era fcil para turistas agendar um tour com paradas em trs stios antigos espetaculares –comeando em Petra, famosa cidade entalhada em colinas de pedra rosada no sul do pas, ento em Jerash e em seguida Palmyra, na Sria.
Palmyra tem muitas coisas comuns com Jerash –as duas foram cruzamento de culturas no mundo antigo e ambas exibem bem preservadas colunatas e majestosos anfiteatros romanos. Mas a cidade sria recentemente caiu sob o controle do grupo extremista Estado Islmico, que tem ficado conhecido por pilhar ou destruir muitos artefatos culturais.
De acordo com o Observatrio Srio para os Direitos Humanos, baseado no Reino Unido, o EI usou o anfiteatro de Palmyra para matar quase duas dzias de prisioneiros.
Na mesma semana, em Jerash, cerca de 40 meninas em uniformes escolares azuis sorriram e cumprimentaram um pequeno grupo de turistas chineses, que posaram para fotos coletivas segurando sombrinhas para se proteger do sol.
Escavaes recentes mostraram que Jerash tem sido inabitada desde a era do bronze, deixando para trs camadas de antiguidades das civilizaes grega, romana e bizantina e do califado de Umayyad. A cidade moderna tem cerca de 200 mil habitantes e o principal mercado fica bem ao lado do stio arqueolgico, com fileiras de lojas de roupas e acessrios e barracas de vegetais cercadas por mesquitas, casas de alvenaria e prdios degradados.
Especialistas dizem que no mais do que um quarto da cidade antiga j foi escavado, e que importantes runas romanas provavelmente ainda esto abaixo dos atuais mercados e casas.
A baixa no turismo ameaa muitos trabalhos em Jerash e algumas lojas de antiguidades j fecharam as portas. Moradores e donos de negcios locais jogam a culpa em muitas direes –na beligerante vizinhana da regio por assustar os visitantes, no governo e nas autoridades do turismo por fazer pouco para atra-los de volta, na comunidade internacional por no resolver a crise e acabar com a violncia brutal.
Se as coisas no melhorarem logo, “ser uma tragdia”, disse Shami, do ministrio de antiguidades. “Qual ser o resultado quando todas essas pessoas perderem seus meios de subsistncia?”
Traduo de GUSTAVO SIMON