“É preciso olhar para o turismo como indústria”, diz Vinicius …

A experiência de décadas no setor turístico e de negócios impede que o catarinense Vinicius Lummertz seja objetivo ao tratar do assunto. Ele vê o turismo como uma questão macro, que envolve economia, política, cultura, história e sociedade. Em entrevista de cerca de uma hora na tarde desta quinta-feira (28), dia em que foi publicada sua nomeação como presidente da Embratur (Instituto Brasileiro de Turismo), afirmou que o grande desafio é dar mais competitividade ao mercado nacional e fazer com que o turismo seja visto como indústria.

 

Lummertz é bacharel em Ciência Política pela Universidade Americana de Paris, com pós-graduação no exterior. Já foi secretário de Turismo de Florianópolis e de Planejamento e de Articulação Internacional do governo do Estado. Sua nomeação foi comemorada pelo setor turístico. “É um orgulho termos um catarinense com poder de divulgar o país no exterior. Precisamos cada vez mais de turistas internacionais. Ele tem cabedal para difundir Santa Catarina para este turista, mostrando que temos atrativos capazes de competir com o mundo”, avaliou João Moritz, presidente da ABIH-SC (Associação Brasileira da Indústria de Hotéis de Santa Catarina).

Para o presidente da Santur, Valdir Walendowsky, “a nomeação é altamente positiva”. “Ele é do setor, tem conhecimento da área internacional, atuou no governo do Estado, morou fora do Brasil. É uma escolha excelente, ele tem capacidade e será muito bom para Santa Catarina”, opinou. Ele sugere que o trabalho da Embratur seja focado na América do Sul.

Lummertz deixa o cargo de secretário nacional de Políticas de Turismo para substituir Vicente José de Lima Neto, que estava no comando da Embratur desde março do ano passado. A posse está marcada para a próxima terça-feira, às 15h, no auditório do Ministério do Turismo, em Brasília.

 

“É preciso olhar para o turismo como indústria, com uma nova lógica”

À frente da secretaria de Políticas de Turismo, o senhor coordenou o Plano Nacional do Turismo, um documento referência para o setor produtivo e gestores. Como esse documento foi elaborado? Representa mudanças práticas no setor?

A primeira tarefa que eu aceitei no âmbito dos mil dias como secretário foi a elaboração do plano nacional, com o estabelecimento de grandes metas e ações. O subtítulo do plano é “o que o turismo pode fazer pelo Brasil”, e pode fazer muito. São 53 setores diretamente afetados e ao lado da agricultura tem o maior número de vantagens. Temos o maior potencial natural de turismo entre 140 países. Na área cultural subimos da 23ª para a 15ª posição. O Brasil foi descoberto culturalmente, isso aconteceu com a Copa. Há investimentos em aeroportos, estradas. O crescimento da classe média fez com que o brasileiro viajasse mais de avião. O turismo interno é robusto. E se nós aplicarmos a essa indústria o que aconteceu na agricultura, vamos ter resultados iguais ou até maiores. A liberdade de empreender houve na agricultura e o conhecimento técnico. Isso transformou a agricultura. Tivemos uma revolução. E no turismo temos esse potencial. No ano passado foram investidos mais de R$ 60 bilhões no turismo do Brasil. De forma direta e indireta são 8,8 milhões de empregos. 9,6% do PIB nacional, 12% do PIB catarinense são motivados pelo turismo.

Uma de suas defesas é que o turismo se desenvolva baseado em riquezas naturais. As duas questões caminham lado a lado?

Temos hoje a sugestão de novas leis tramitando no Congresso Nacional. Queremos trazer alguns parques naturais para a administração do Ministério do Turismo. Avançar nessa direção significa enfrentarmos o fato de que subimos muito na competitividade do turismo – na hotelaria, estádios, tivemos incrementos – mas ainda temos problemas causados pela burocracia. Nós dificultamos as atividades do turismo. Nós criamos uma cultura no Brasil de dar incentivos para a indústria. O turismo não recebe esses mesmos benefícios, mas enfrenta as mesmas dificuldades da competitividade. O Luiz Henrique da Silveira falava sobre os arcaísmos brasileiros, que são essas leis, interesses coorporativos, falta de consenso. É preciso olhar como indústria, com uma nova lógica. Santa Catarina é o Estado do Brasil que tem o maior potencial conjugado. Não está concentrado em uma capital ou em um endereço. O que temos junto de beleza natural e densidade cultural tem um potencial mundial. Na questão de mão de obra, não estamos em uma posição boa; em abertura internacional, também não. Estamos melhorando, mas precisamos de mais. Temos espaço para melhorar.

Qual o primeiro passo para que a desigualdade em relação a outros países no setor turístico reduza?

Como o turismo não é uma única atividade econômica ele depende de uma tomada de consciência, de postura. Temos um exemplo laboratorial de Gramado. As vantagens lá foram criadas, inventadas. Quando você vai para as zonas especiais de turismo do mundo, temos muitos projetos assim. É o caso, por exemplo, de Cancun ou Orlando. O turismo é o quinto item na balança internacional brasileira, mas queremos aumentar. Precisamos internacionalizar a cadeia de negócios. Mas temos medo. E o medo é a falta de coragem e de responsabilidade. É o caso dos parques naturais, que no exterior já se fazem coisas consistentes. Nós temos que abrir. Não podemos ser um país fechado para investimentos, mas é preciso um entendimento mais pacífico.

Na semana passada, o senhor participou de uma reunião sobre Florianópolis entrar na rota de cruzeiros no país. Este plano é possível?

Passam aqui na frente de Florianópolis 200 cruzeiros durante cinco meses. Estamos discutindo essa situação, mas não podemos abrir mão disso. Existe um incômodo? Existe, mas tem que ser planejado. Porque gera renda, gera emprego. É uma cidade que tem duas baías, isso tem que ser aproveitado. As pessoas se beneficiam disso. Nesta reunião avançamos. Saímos com o compromisso do secretário de Planejamento, Murilo Flores, de dividir uma conta para fazer a batimetria das baías, para definir a parada dos cruzeiros, localização das marinas. Eu não desrespeito a posição de quem ignora os benefícios dessas atividades, mas confiante de ter experiência desses negócios em outros locais, fica muito claro que são compatíveis com a cidade desde sua invenção. Esse lugar foi inventado pelo mar. É absurdo que esse assunto não seja tratado como forma de fazer com que a população se beneficie.

O atual ministro do Turismo, Henrique Eduardo Alves, demonstrou recentemente que o queria em seu time e também sugeriu um novo modelo de trabalho para a Embratur, que “tem que atuar para dentro também, incentivar o turismo doméstico”. É esse o foco?

Eu e o ministro estamos trabalhando em uma revolução institucional da Embratur para que ela tenha mais capacidade de captar investimentos, participar das decisões e trabalhe também com a possibilidade de marketing interno junto com o internacional. É um diagnóstico que já fizemos. O turismo está ficando mais claro na cabeça das pessoas, que não é só uma atividade lúdica, de lazer. Ele segue a lógica de servir, e estamos na era dos serviços. É dramático ver o quanto as pessoas se comportam de forma obtusa. Esse país já foi um país aberto. Santa Catarina foi um grande encontro de trocas de ideias. Mas nos transformamos hoje em um país conservador, careta, de interesses corporativos. Não podemos ser isso, ou não desenvolveremos nossa potencialidade. Temos um bom número de belezas naturais. O que vamos fazer com isso? Temos que fazer isso no nível de nossas responsabilidades, não no nível de nossas esquizofrenias.

O setor turístico foi afetado pela crise econômica mundial?

Não, o Brasil cresceu no ano passado, foi o melhor ano turístico do Brasil, com os eventos. Estamos novamente num ano bom, vamos ter Olimpíada no ano que vem. Temos que aproveitar para divulgar bem o país. O índice de competitividade também subiu muito, fomos da 51a para a 28a posição. Os aeroportos estão melhores, as estruturas.

Antes de ser confirmado na Embratur, seu nome foi cogitado para assumir o Ministério do Turismo e a Casan. Como o senhor acompanhou esse debate?

Isso fez parte de um momento no qual eu fui chamado para uma discussão para participar do governo do Estado. Como eu sou partidário, a discussão evoluiu. Mas, paralelamente, havia a questão da Embratur. Quando veio o convite da Embratur, eu aceitei. Porque um cargo nacional, em Brasília, passa a ser mais relevante para Santa Catarina. O apoio a minha ascensão na Embratur foi da bancada de Santa Catarina em peso, especialmente ao Mauro Mariani, que é um grande amigo e um discípulo de Luiz Henrique, assim como eu. Assumir o ministério foi uma possibilidade no passado, como mandato tampão, mas quando o cargo saiu da alçada da Câmara, ficou inviável. Eu prefiro ser presidente da Embratur do que ex-ministro.