Na Argélia, exército e polícia escoltam turistas estrangeiros

Em fevereiro deste ano, fiz uma viagem com a minha mãe para o norte da África. Escolhemos o Marrocos como destino principal, mas queríamos visitar também outro país próximo. Como a Turquia e Tunísia se apresentavam como destinos com iminentes perigo nos noticiários, pesquisamos outras paisagens e histórias e acabamos escolhendo a Argélia.

De cara encontramos diversos obstáculos para chegar lá. Para conseguir o visto, precisávamos de todo o itinerário fechado e comprado, e há pouca informação disponível sobre o país, não sendo possível, por exemplo, encontrar hotéis e passagens nacionais pela internet.

Créditos: mtcurado/iStock

Vista da cidade de Argel, capital da Argélia

Como não foi possível comprar “no varejo” começamos a buscar uma agência com a qual conseguimos fechar um pacote. Encontramos uma única agência que organizava a viagem em todo o território nacional, com guias em inglês ou francês, e não apenas em árabe.

Custou-nos uma fortuna, sim: cinco dias na Argélia seria quase equivalente a 15 dias no Marrocos, mas estamos animadas. Com tudo combinado e uma carta da agência Expert Algeria como convite, conseguimos o visto, juntamos o dinheiro e partimos para lá.

Chegamos de Casablanca direto para Argel, capital do país onde nos hospedamos pela primeira noite. Nossa primeira surpresa, que veio a marcar toda nossa viagem, foi ao tentar sair do hotel pela primeira vez. Nosso guia nos explicou que estávamos esperando a polícia, que nos acompanharia em todo o trajeto. Ele nos contou que toda agência, hotel e demais operador de turismo tinha a obrigação de informar ao estado o itinerário dos turistas que entravam no país, e que, em quase todos os casos, isso significava um esquema de vigilância por meio da escolta em todos os lugares.

Com um regime mais fechado e a falta de hábito de receber turistas, a força policial se move para impedir um escândalo caso algum confronto social resvale sobre a segurança de um estrangeiro. Sem outra opção, acatamos o esquema.

A cidade de Argel é muito bonita, apesar de descuidada, e há muita coisa interessante para se ver.

Além disso, o país é muito marcado pela presença que teve no território o Império Romano, de forma que há diversos sítios arqueológicos para visitar. De Argel fomos a Tipasa, que não fica muito longe.

Então, a força policial não era nada de mais além de uma companhia indesejada? Nem tanto. O processo gerou vários tropeços na programação, por que a cada mudança de equipe que nos seguia perdíamos um tempo enorme esperando outro carro (foi assim atravessando o norte do país na direção oeste para visitar as cidades de Temcen e Oran, por exemplo).

A força policial e militar quase não fala francês, que apesar de ser língua oficial do país, não é amplamente disseminada. De forma que ao longo de todos os dias, nosso contato sobre a escolta foi exclusivamente com o guia, que também nos explicou que não lhe era comunicado tudo que envolvia a escolta.

Isso nos marcou especialmente no centro do país, em Ghardaia. O local é uma comuna berbere patrimônio da humanidade pela Unesco, onde pudemos visitar a medina e suas belas construções, e onde os hábitos e o coletivo se dividem por família. Lá conhecemos o sistema de distribuição de água que cria um oásis de um riacho e abastece a cidade toda, igualmente.

Foi uma das coisas mais interessantes que vimos, sem dúvidas, mas tivemos o desprazer de, entre uma coisa e outra, ficar duas horas “detidas” no quartel local, enquanto esperávamos uma inspeção em nosso passaporte sem saber por que e o que estava sendo feito de nossos documentos e itinerário.

E foi exatamente assim que passamos os cinco dias na Argélia: vimos paisagens muito bonitas, mas todas com a constante presença da polícia ou do exército. Definitivamente, causa uma sensação de tensão, um constante estresse, que pesou nosso humor e disposição durante a viagem.

Sempre que me perguntam se eu vou voltar, eu penso no quanto foi importante, por um momento que seja, entender o que é este estado sitiado da segurança, além de ver paisagens tão bonitas. Minha resposta é: eu gostaria, mas após uma mudança no regime político, de repente para ver o que se tornou diferente e o que permaneceu, de um universo tão distante do meu.

Relato por Catarina Corrêa von Sperling

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