Em casa, no Butão

Mesmo para quem est acostumado com pousos e decolagens bruscos, a chegada a Paro foi uma aventura parte.

Quando estamos j em “procedimento de descida” –como nos anunciam os pilotos, quase sempre num tom automtico–, um dos grandes prazeres que temos, sobretudo ao sobrevoar um territrio pela primeira vez, apreciar a vista l de cima. Inclusive a rea em que voc vai pousar.

No Buto, porm, um pas maravilhoso no meio do Himalaia, no fcil encontrar espao plano para uma aterrissagem razovel. Espremido entre o Tibete e a ndia, esse uma espcie de paraso nas alturas. Mas chegar l, para quem teme voos arriscados, uma descida aos infernos.

O piloto sobrevoa a pequena Paro em crculos; voc sente que vai perdendo altitude –s no consegue ver a pista! A, de repente (e no uso a expresso como mera figura de linguagem), P! Voc est no cho. No me lembro de ter vivido uma aproximao to… emocionante!

Em compensao, uma vez l, voc se sente em casa. Mesmo a mais de 3.000 metros do nvel do mar –altura em que seus pulmes j detectam que no vo ter todo aquele oxignio a que esto acostumados-, as pessoas fazem de tudo para tornar sua estadia memorvel, com o mximo de conforto.

Fiquei hospedado, verdade, num hotel de luxo, daqueles que, diante de uma longa jornada por terra, arrumam uma cama com lenis e tudo no banco de trs do carro que vai levar o hspede. Mas a gentileza estava mesmo nos detalhes –como na adolescente que oferece um pedao da carne de iaque (uma espcie de bfalo das montanhas de l), to gentil que voc no tem coragem de recusar.

No Buto, fui a lugares to lindos quanto sagrados, como o mosteiro conhecido como Ninho do Tigre: uma construo espetacular “encravada” num penhasco. Vales e montanhas paradisacos, onde fui recebido como algum que morasse h anos naqueles vilarejos. Mas nunca me senti to em casa como quando cheguei hospedagem Aman Gangtey.

Em termos de simplicidade, as acomodaes quase redefiniam a noo de um quarto espartano. Mas o aconchego ali no estava no exagero, e sim justamente na simplicidade.

Falava-se pouco nas dependncias do Gangtey, uma antiga fazenda adaptada pela rede de hotis. Mesmo nas refeies, os parcos hspedes mal conversavam, e a razo disso no era uma antipatia compulsria –que j encontrei tantas vezes em grupos de turistas supostamente sofisticados. Pelo contrrio: o clima era de paz.

Era na ausncia de sons que aproveitvamos o cenrio, extraindo do olhar algo alm da sua capacidade de meramente registrar. Ali, tive –talvez mais forte do que em qualquer outro lugar do mundo– a sensao de pertencer a ele. De conexo com tudo.

Esses dias no Buto no foram s inesquecveis, mas fundamentais para eu me recarregar. De tranquilidade, de deslumbramento –e de coragem para entrar novamente num avio sabendo que a decolagem no seria mais suave que minha experincia na chegada por l…

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